sábado, 14 de novembro de 2009

Na América profunda


Seis horas de diferença horária, 18 de viagem

Lisboa.
Estou sentado diante de uma grande janela no Aeroporto da Portela. Um sol pálido, matinal, que surge por entre as nuvens ilumina-me o rosto, nos tons pastel deste Outono tardio. Em frente à janela, do lado de fora, o Airbus A 3-19, da TAP, que me levará para Londres, a minha primeira escala nesta re-visita aos Estados Unidos. Depois da latina Miami e da cosmopolita Portland, é a vez de entrar na América conservadora, o Estado de Oklahoma e no coração da 'Bible Belt', Tulsa. A América profunda dos 'red-necks'. A ver vamos, porque há sempre uma expectativa quando uma pessoa se adensa no seu desconhecido. É a caixa das surpresas...

Aeroporto de Heathrow, Londres.

Neste início de tarde, Londres está ensolarada, apesar das núvens.
Há quantos anos não venho a Inglaterra? Dez? Quinze? Já não me lembro. Como também já não me lembrava o quanto de gigantesco é este aeroporto e o que se caminha, se caminha, se caminha...
É com alguma emoção que ao sobrevoar a cidade revejo os seus bairros burgueses de casas tão peculiares, de dois pisos e sala projectada para o exterior, através de uma janela semi-circular ou semi-hexagonal; revejo os parques verdejantes, do qual já quase me tinha esquecido, no meu Sul fustigado pela seca.
Enquanto espero, durante quase três horas, entre um avião e outro (o próximo será um Boeing 767-300), flashes da minha memória emergem: as muralhas de Adriano em Chester, numa caminhada num dia frio, na companhia de Brian. A cada dos Thompson em Wigan. As docas do porto de Liverpool. O edifício da Bolsa de Manchester. Blackpool e a sua praia de areia, excepção das praias de seixos das costas inglesas e as suas iluminações. A casa de Brenda, em Rochedale, nos subúrbios de Manchester e berço do sindicalismo. A bomba do IRA que rebentou a 200 metros de mim, naquela manhã de 3 de Dezembro, no centro de Manchester. A paisagem inglesa das cottages que se abre desde a janela do comboio. Birmingham. Os pequenos-almoços de chá com leite e baccon com feijão e um ovo estrelado...
Mas também o mar pontilhado de velas brancas, vistos desde uma praia ventosa, numa manhã chuvosa de domingo, na Ilha de Wigth, no Canal; e a estrada coberta de neve, a caminho de Thornton, no Yorkshire, terra natal das irmas Brönte. E um flash mais antigo de visitas, em Londres, à Tate Gallery e ao Museu de Cera de Madame Tussaud. Enfim, um rio de recordações de toda uma vida...

Boieng 767.

As viagens intercontinentais têm destas coisas curiosas: ao voar para Oeste, vamos acompanhando o movimento de rotação da Terra, 'prolongando' o dia. Saímos de Londres com o tempo já completamente mudado. Se a chegada foi ensolarada, o partida foi no meio de grossas nuvens cinzentas, carregadas de chuva fina. O fim de tarde tristonho tornou-se mais escuro ainda e foi com esta luz crepuscular que viajámos, na maioria do percurso sobre o Norte do Atlântico, até à costa canadiana. A aproximação do continente americano foi marcado por uma ligeira turbulência, resultante do choque das massas de ar continental e marítima e foi já noite fechada que chegámos ao Aeroporto O'Hare, de Chicago, às 18h00 locais, meia-noite em Lisboa e com 45 minutos de avanço em relação à tabela. À minha espera, depois de mais uma hora e meia de compasso, a última etapa desta já longa viaagem de Lisboa a Tulsa.

Canadair Regional Jet 700

Passou depressa o tempo de espera entre os voos, com os procedimentos aduaneiros de entrada nos Estados Unidos. Fichado electronicamente para uma qualquer gigantesca base de dados federal. Também, como neste país, os meus propósitos são pacíficos, ser fichado entre antos milhões, não me aquece nem me arrefece: como diz o ditado, quem não deve, não teme.
Na alfândega, lá se me foram os ricos chouriços de porco preto, religiosamente guardados para o célebre arroz de pato. Mas menos mal, que os 19 litros de vinho e os 2 de espirituosos, passaram cantando e rindo, sem entraves nem impostos! God bless America!

Estes voos domésticos têm o mesmo conceito do autocarro. O Canadair é um avião pequeno, apertado e feio...

Finalmente Tulsa, os meus muitos queridos Emillie e Gary e, ginja sobre o bolo, de novo as malas perdidas, desta feita em Chicago... Menos mal que, já de sobreaviso, na mochila de mão, levava duas mudas de roupa interior...

1 comentário:

  1. Pelo que discorre me senti viajando, como sempre, viajo sem sair do local , me doe saber que as palavras do texto me soa sem alegria ou mesmo tristeza , simplesmente mistério, o tempo passou pelo que li e retornaste, aproveite pq a gente nunca sabe se vai ser uma despedida ou a última.., se cuide e boa sorte

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