segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Billy Gail's Cafe, Branson, Missouri

Sandy anda numa roda-viva, de cafeteira na mão. Irradia uma doçura muito própria na expressão do seu rosto. Trata as pessoas por 'honey' (querido). As várias salas estão cheias: nas paredes centenas de peças antigas que dão à casa um aspecto acolhedor e caseiro; nas mesas dezenas de pessoas que diariamente ali vão para um magnífico pequeno-almoço. É o Billy Gail's Café, nos arredores de Branson, Missouri.



Boa comida e simpatia são os segredos deste pequeno restaurante à beira da estrada.
Bill é um homem grande, com um porte aristocrático, apesar de hoje estar confinado a uma cadeira de rodas. Ele e Gail, uma mulher que é uma força da natureza, apesar dos seus 73 anos, são os donos deste pequeno espaço encantado e encantador, na zona turística de Branson.
"Viemos do Minesota em 1995. Antes tínhamos estado aqui de férias e ficámos encantados com a região", conta-nos Bill, 68 anos. Um encanto fortuito, já que foi a neve que obrigou o casal a parar neste recanto.

Bill e o seu porte de patriarca e em último plano Abril, que se ri a bom rir

Bill e Gail, frente ao seu restaurante

Decidiram, então, comprar um pequeno restaurante vago em Banton Street e dois anos depois adquiriram este, associado a uma bomba de gasolina.
"No primeiro restaurante que abri, o meu filho trabalhou ainda comigo, mas depois surgiu-lhe uma oportunidade de trabalho em que recebia três vezes mais do que aquilo que eu lhe podia pagar e ele seguiu o seu caminho", comenta Bill com uma nota melancólica na voz.
Hoje, Bill e Gail não lamentam a decisão que tomaram. "É uma excelente experiência, com as pessoas maravilhosas que aqui vêm. É mesmo uma experiência única", acrescenta Bill. "Temos mesmo turistas que aqui vêm apenas porque alguém lhes recomendou o nosso pequeno-almoço", concluí. Ao lado de Bill, um homem de Kansas confirma a história e eficácia do 'boca-a-ouvido': "Vim porque em Branson recomendaram-me o pequeno almoço que aqui é servido".


Casa cheia todas as manhãs. O restaurante é um mito na região

Pessoas desconhecidas sentam-se à mesa-redonda e tornam-se amigos. O mistério da partilha do momento da comida

Com um sorriso cândido, Bill explica: "Sou um grande comilão. Por isso prezamos em apresentar aqui boa comida"...
De facto, cada pequeno-almoço, além de deliciosamente preparado, é substancial e rapidamente nos cativa.

Um copioso crepe de deixar os congéneres franceses 'verdes de inveja'


"Optámos também por este estilo de decoração, porque quisemos que este fosse também um local caseiro, onde as pessoas gostem de estar", acresce Bill.







Rina atende os pedidos. Com uma memória fantástica, no dia seguinte lembra-se ainda do que cada um pediu...

Lá fora, o sol espreita por entre as árvores despidas de folhas. Sopra um vento frio, mas aqui dentro, entre o vozear alegre das pessoas, a vivicidade de Gail e a simpatia de Sandy, April e a jovem Rina, reina o calor. O calor humano.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Dia de Acção de Graças

O calendário ritual norte-americano centra-se no Dia de Acção de Graças, 'Thanksgiving Day', na última quinta-feira de Novembro.
Desde o Halloween que as casas, os centros comerciais e muitos outros locais públicos fazem gala nas decorações alusivas à refeição com que os 'Pais Fundadores' (Pilgrims Fathers) - desembarcados da Mayflower em 1620) fizeram, um ano depois de chegarem a América, celebraram em acção de graças por terem conseguido sobreviver.
Feriado nacional, é, juntamente com o Natal, o dia predilecto para o encontro das famílias, tendo por centro a mesa onde são servidas as iguarias que relembram os produtos iniciais com que os Pilgrims sobreviveram: o perú, a abóbora, a batata doce, o milho, as frutas do bosque e as saladas.
Virtualhas orgulhosamente feitas em casa...


Hipermercado Walmart, Tulsa, Oklahoma



Jenks, Oklahoma





Great Cedar Lodge, Branson, Missouri



A preparar o jantar do Thanksgivind...




Preparando a massa para as tartes




Tarte de abóbora antes e durante a cozedura no forno





A elegância das cerejas na sua tarte...



Batata doce, coberta de açúcar mascavado, à espera da cobertura de marshmelows, antes dr ir ao forno



Sua senhoria, o perú...

O recheio de verduras e pão, para o perú



Julia, convidada, participa com a sua especialidade: puré de batata.





Os pãezinhos à espera de irem ao forno...





As saladas.



Os doces....




Jantar do Dia de Acção de Graças, na Igreja de Jenks



O jantar de Acção de Graças em família.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Tragédia da guerra

Entrada do Parque-Museu de Wilson Creek, Missouri

A guerra é um dos acontecimentos mais trágicos na história da Humanidade. E mais trágico ainda quando se trata de uma guerra civil, onde vêm ao de cima os rancores pessoais, bairristas. Enfim, a barbárie da barbárie.
Com uma história relativamente recente, os EUA foram dramaticamente marcados pela Guerra Civil, entre 1861 e 1865. Este impacto tem especial relevo nos Estados do Sul, onde se desenrolaram a maioria dos combates entre a União (Norte, sob as ordens do presidente Abraham Lincon) e os Confederados (sob as ordens do presidente Jefferson Davis).
No inicio do conflito, os chamados 'Estados Fronteiriços', Maryland, Kentucky e Missouri, mais ou menos situados entre os dois blocos e com posições de interesse estratégico para ambas as partes, estiveram mais tentados a manter uma posição neutra, atitude nada satisfatória para os beligerantes.


Os Estados fronteiriços às partes em conflito, assinalados a cinzento

Neste contexto, o Missouri tinha um alto valor estratégico: não só pela sua riqueza humana, mineral e agrícola, como também por ser o cruzamento de dois importantes caminhos: as ligações Califórnia/Oregon (norte/Sul) e as rotas para Santa Fé e as da Pony Express (Este /Oeste), tendo ainda em linha de conta a ligação entre os rios Missouri e Mississipi, pela embocadura do rio Ohio. E com as ambições centradas no Estado, os simpatizantes locais de ambos os lados, cedo pressionaram a situação, até se entrar num conflito aberto.
Os campos de Wilson Creek, cerca de 20 quilómetros a sul de Springfields, junto à casa do fazendeiro John Ray, foram palco de uma das principais batalhas, depois conhecida pelo nome deste local.Wilson Creek (Ribeira de Wilson)

Os combates ocorreram a 10 de Agosto de 1861. Foi a maior batalha deste período a Oeste do Mississipi, envolvendo 6.000 soldados da União e 12.000 confederados, inclusive a Mussouri State Guard, uma força de milicianos inicialmente criada para defender o Estado de agressões quer do Norte, quer do Sul e que, posteriormente, se viria juntar aos Confederados. Crê-se que com os mais de 2500 mortos, foi o episódio bélico que, até então, vitimou mais cidadãos norte-americanos, desde a declaração da Independência, em 1776.
Os campos de Wilson Creek estão hoje preservados num parque que, com o respectivo museu, relembra os vários aspectos, mais ou menos dramáticos deste conflito fraticida. Nas salas de exposição, além de um vídeo que reconstituí a batalha e analisa os factos, são mostradas as estratégias dos generais, uniformes, armas.






Hoje, ao passear por estes campos calmos, no final de Outono, quase que nos custa a acreditar que ali um dia troaram os canhões, a vomitar fogo e morte e que milhares de homens encontraram o fim da sua vida...



A várias de dezenas de quilómetros de Wilson Creek, já no Estado do Arkansas situa-se Peas Ridge, a outra pagina sangrenta desta história da Guerra Civil Americana.
Peas Ridge, Arkansas


Com as batalhas travadas neste local entre 7 e 8 de Março de 1862, a União conseguiu assegurar definitivamente o Missouri para o seu lado. Nestes dois dias combateram 10.250 soldados da União, metade dos quais formando o contnigente de emigrantes alemães de St. Louis, contra 16.000 militares confederados, entre os quais se contavam 800 soldados índios cherokees.
Trincheiras em madeira, onde os soldados aguardavam os ataques



No total, 3.384 baixas, entre mortos e feridos, para ambos os lados.
Hoje, 147 anos depois, Gary Smith olha os campos de batalha onde o seus tetra-avôs e um irmão, integrados na Missouri State Guard, perderam a vida...
Terá valido a pena?




domingo, 15 de novembro de 2009

Voluntários para uma casa

Sábado, 14 de Novembro 2009

Na manhã fria de meados de Novembro, os carros vão chegando ao bairro modesto na periferia de Jenks, pequena comunidade nos arredores de Tulsa, Oklahoma, e param frente a uma casa em construção, frente à qual está uma mesa, onde os mais adiantados já deixaram alguma comida e cafeteiras de café quente. É uma manhã de sábado, mas estas pessoas, grande parte reformados, mas também bastantes jovens, a ficarem na cama ou irem para o centro comercial, preferem dar o seu contributo voluntário para a construção de casas para os mais desfavorecidos. Neste caso para uma jovem mãe, Chianti, de 30 anos, e os seus dois filhos pequenas, de cinco e sete anos.
. Ed organiza o trabalho dos voluntários

"Estes são os verdadeiros americanos, a América verdadeira que não aparece nem nos filmes nem nos noticiários", diz-me, com um sorriso franco e saudável, Lois, uma voluntária que já passou a meia-idade.
O pessoal junta-se frente à mesa, onde Ed, o encarregado da obra, destina trabalhos, explica como se faz, organiza as tarefas.
"Este é um projecto inserido no programa 'Houses for Humanity', lançado por Jimmy Carter e apoiado por diversos grupos, entre os quais as igrejas, como esta de Jenks", explica-me Gary, que, também voluntário, arrastou-me para esta aventura de solidariedade.



Gary coloca o chão


Com efeito, esta comunidade evangélica, no âmbito de apoiar uma outra igreja mais pobre, comosta sobretudo por gente que provem de lares desfeitos e por antigos prisioneiros, lançou-se na construção da casa para Chianti, um dos membros da congregação. Primeiro, com a angariação de fundos para os materiais, depois com a mobilização de voluntários para a construção.
Nesta manhã, somos quase três dezenas de voluntários: uns, no exterior, a alisar a terra e a colocar o tapete de relva, outros, dentro de casa, a colocar as placas de revestimento do chão. Chianti e a sua mãe, Brenda, de 52, também ajudam activamente nas tarefas. A responsabilização através do trabalho fará com que a casa seja mais estimada.


Chianti e Lois, na colocação do chão


E toda a gente tem uma outra razão ainda para estar contente: a casa, que era previsto estar pronta para o Natal, vai estar, afinal, pronta no Thanksgiving, a quinta-feira em que se celebra o Dia de Acção de Graças.

Chianti, a mãe, Brenda, e uma das irmãs de Chianti


Entre os voluntários, está também o pastor da Igreja de Jenks, Tracy, que coloca a relva, ao lado de outros companheiros. Sempre bem disposto, tem uma palavra amigável, interessa-se por cada um.


Primeiro alisar a terra, depois colocar o tapete de relva

Aos poucos, a casa mostra-se na sua beleza final: um lugar acolhedor, simples mas confortável, porque pobreza não quer dizer, de modo nenhum, negação ao direito à dignidade humana. Apesar de haver por aí muita gente que pense que sim...
Aos poucos descubro a importância aglutinadora das comunidades religiosas na América profunda. "A zona central dos Estados Unidos é o que chamamos 'The Bible Belt' (A Cintura da Bíblia), comunidades cristãs, que levam muito a sério a Biblia e a prática do cristianismo em cada momento da vida real. E Tulsa é o centro deste 'Bilble Belt", explica-me a minha irmã Emilie.
Com efeito, em Tulsa populam igrejas de todas as orientações, desde a Católica à Mormon, passando por todas as variantes. Observo de perto esta sociedade e considero que uma pessoa pode não concordar com estas igrejas, em termos teológicos, mas não pode negar o importante papel que elas desenvolvem na organização da sociedade no interior norte-americano.